Os Flops que Amamos: Pecado Mortal (2013/14)

Produzida e exibida pela RecordTV, a novela Pecado Mortal estreava há 10 anos pela emissora do Bispo Macedo como uma grande aposta do canal, mas que acabou com a audiência e a repercussão bem abaixo do esperado, mesmo bem avaliada pela crítica especializada do gênero. Marcada por uma trama com diálogos rápidos e entremeados por sarcasmo, humor de cunho sexual e/ou duplo sentido e corpos quase nus, características de obras “Lombardianas”, o enredo precisou se ajustar durante a novela por conta de diversos empecilhos nos bastidores desde o elenco até a sua direção. Exibida entre 25 de setembro de 2013 e 30 de maio de 2014, em 176 capítulos, a obra escrita por Carlos Lombardi, com colaboração de Emílio Boechat, Margareth Boury, Mário Viana, Nélio Abbade e Renê Belmonte, e a direção geral de Alexandre Avancini, também é lembrada por uma narrativa envolvente e um elenco afiado, de nomes como Fernando Pavão, Simone Spoladore, Paloma Duarte, Vitor Hugo, Betty Lago, Jussara Freire, Luiz Guilherme e Denise Del Vecchio nos papéis centrais. Por isso, vale relembrar a trama, bastidores e curiosidades desta produção repleta de ação e humor, e que já faz parte dos ótimos trabalhos da teledramaturgia do começo da década passada.

Fernando Pavão (Marco Antônio Vêneto/Carlão) e Patrícia Salgado (Simone Spoladore) foram os personagens centrais de Pecado Mortal. Novela de Carlos Lombardi completa 10 anos de estreia em 2023. (Foto: Reprodução/RecordTV)

Enredo

A história transcorre no final da década de 1970, um período que marcou a história do Rio de Janeiro, principalmente ao que concerne à criminalidade no Brasil. O uso de drogas se espalha pela sociedade brasileira transformando a estrutura de poder entre os mafiosos. Se antigamente os morros eram comandados por patrões do jogo do bicho, foi a partir do final dos anos 1970 que o poder passou para as mãos de traficantes.

Anos antes, em 1941, Stella (Marcela Barrozo), para salvar a própria vida, deu seu filho recém nascido para Donana (Maytê Piragibe), que fugiu com a criança. Em 1977, Stella (Betty Lago) retorna à procura de seu herdeiro que lhe fora roubado por Donana (Jussara Freire).

Assim, aparece Carlão (Fernando Pavão), que é na verdade Marco Antônio Vêneto, porém, decide renunciar a família para morar afastado do mundo do pai, o poderoso bicheiro Michelle Vêneto (Luiz Guilherme), o marido de Donana. Ele casou-se com a promotora de justiça Patrícia Almeida (Simone Spoladore), e os dois vivem felizes com dois filhos pequenos, quando Carlão é indiciado por importunar as crianças da escola infantil onde é sócio.

Picasso (Viitor Hugo) e Carlão (Fernando Pavão) em cena de Pecado Mortal. Novela “Lombardiana” conquistou a crítica televisiva com um melodrama de ação, mas sem fugir muito de características habituais de suas obras. (Foto: Reprodução/RecordTV)

Produção

A novela foi estabelecida pelo seu autor, Carlos Lombardi, como um melodrama de ação com algumas pitadas de humor – diverso de seus trabalhos na Globo, centrados pela comédia de ação. A viabilidade de escrever algo diferente de suas habituais comédias na Globo foi o que incentivou Lombardi a mudar para a concorrente.

Ainda assim, Pecado Mortal esteve e fixou-se dentro do que se aguardava de uma obra de Lombardi: diálogos rápidos e entremeados por sarcasmo, humor de cunho sexual e/ou duplo sentido, corpos quase nus, relações familiares recheadas por conflitos e, grande gama de ação, perseguição e luta.

Capítulo de estreia promissor, mostrando a primeira fase, na década de 1940, com os antecedentes dos protagonistas. Roteiro, direção, fotografia e reconstituição de época impecáveis.

Pecado Mortal foi a única novela de Carlos Lombardi na RecordTV e a quarta emissora que trabalhou fora da Globo, onde ficou por 31 anos.

Bastidores e audiência

Pecado Mortal, apesar de bem avaliada pela crítica especializada, teve audiência ainda pior que as massacradas três tramas anteriores da RecordTV (Máscaras, Balacobaco e Dona Xepa). A média ao fim do enredo no Ibope da Grande São Paulo foi de 6 pontos, igualando com as menores médias entre as novelas desde a volta da dramaturgia da emissora, em 2004.

Para prender a atenção da audiência, Lombardi até deu maior ênfase ao romance e o apelo familiar, com várias cenas amorosas entre os personagens centrais Carlão (Fernando Pavão) e Patrícia (Simone Spoladore) e sua família.

Carla Cabral (foto) foi Laura Leblon em Pecado Mortal. Trama da RecordTV, apesar de bem produzida e com um bom enredo, não conseguiu atingir bons índices de audiência. (Foto: Reprodução/RecordTV)

Em uma estratégia para impulsionar o primeiro time da emissora, a novela foi reordenada na grade, a partir de 03 de fevereiro de 2014. Pecado Mortal saiu da faixa das 22h30 para a das 21h10, concorrendo diretamente com a estreia da novela do horário nobre da concorrência, Globo, que na época estreava Em Família. Uma clara evidência da falta de carinho e atenção da emissora com sua principal novela diante de um desempenho distante do esperado. A alteração de horário não funcionou e o Ibope não apresentou melhoras.

Bastante lesado diante das circunstâncias, Lombardi se adaptou para levar sua novela pra frente. E os obstáculos começaram com o elenco, que contou com o habitual casting da Record, vindo da minissérie José do Egito (que ainda estava sendo exibida quando a novela começou). A produção foi dirigida por Alexandre Avancini, com algumas contratações e com atores da “companhia lombardiana de comédia” – elenco que já realizou trabalhos anteriores com o novelista como Betty Lago, Heitor Martinez, Tatyane Goulart, Bianca Byngton, Gero Pestolazzi, Carlos Bonow, Luiz Guilherme, Mário Gomes e Cláudio Heinrich.

Devido a falta de atores no elenco da emissora, atores e diretores foram realocados. O ator Marcos Pitombo, por exemplo, não ficou com o papel de Ramiro para entrar na próxima novela do canal, Vitória.

A atriz Mel Lisboa pediu dispensa da novela em fevereiro de 2014, usando como justificativa razões profissionais. Ela almejava maior tempo livre para ensaiar um musical no teatro sobre a cantora Rita Lee. A solicitação causou um mal estar entre ela e a produção. Carlos Lombardi tentou fazer com que ela continuasse no enredo, diminuindo o número de cenas e sugerindo junto à direção que as gravações de Mel não interferissem nos ensaios da peça. Mas não houve jeito e o autor teve de matar a personagem, o que não estava em seus planos. Lombardi chegou a queixar-se em sua conta no Twitter. (“Novela, a Obra Aberta e Seus Problemas”, Fábio Costa)

Durante o mesmo período da saída de Mel Lisboa e do novo horário da novela, o diretor geral, Alexande Avancini, foi remanejado para outras atrações da RecordTV, deixando Pecado Mortal sob a responsabilidade de seus diretores assistentes.

Donana Vêneto (Jussara Freire) e Stella Nolasco (Betty Lago) em cena da novela Pecado Mortal. Produção teve baixas importantes no elenco e em sua direção. (Foto: Reprodução/RecordTV)

A atriz Betty Lago, que fazia o papel de Stella, uma das personagens centrais da novela, se manteve ausente da obra por um tempo longo por motivo de saúde, atrapalhando a trajetória de sua personagem. Por conta dessas adaptações todas, Lombardi ainda necessitou deixar de lado a ótima personagem de Jussara Freire, a perversa Donana, que tinha grandes confrontos com Stella. As duas também formavam um triângulo amoroso maduro, com Michelle Vêneto (Luiz Guilherme).

O ator Victor Hugo foi a grande revelação da novela. Desde o começo, uma interpretação segura e persuasiva. O elenco teve outras excelentes performances, com Paloma Duarte (Doroteia), Simone Spoladore (Patrícia), Gustavo Machado (Danilo), Carla Cabral (Laura), Luiz Guilherme (Michelle) e Denise Del Vecchio (Das Dores).

Primeira novela do ator Bernardo Velasco.

Abertura

Com a canção “Street Life”, clássico da Era Disco, a abertura compactava em uma cena congelada o enredo policial da produção, onde a câmera transitava em uma sequência difícil, repleta de efeitos, objetos e pessoas, que aludia com as leis naturais da física.

A vinheta utilizou o recurso bullet time – observado anteriormente na abertura da novela Sete Pecados (2007), da Globo -, onde são inseridos rotoscopia de fotografias que cobrem todos os ângulos de uma cena com congelamento de imagens em movimento. A técnica usualmente mistura filmagens em live-action com steadycam e inclusões hiper-realistas em computação gráfica.

Trilha Sonora

A trilha sonora única de Pecado Mortal reuniu clássicos da música brasileira mescladas com sucessos internacionais em suas principais faixas. Destaque para o tema de abertura, “Street Life”, de Laudia Tanzin e também para as trilhas “I Just Wanna Stop”, em uma versão interpretada por Maurício Manieri (tema de Carlão e Patrícia); a contagiante “Dois pra Lá, Dois Pra cá”, na voz de Elis Regina (tema de Stella); “Charme do Mundo”, interpretada por Marina (tema de Leila), o clássico “I Will Survive”, cantada por Issy Gordonentre, entre outras canções. A capa do álbum possuía apenas o logo da novela na capa.

Fernando Pavão como Carlão, protagonista de Pecado Mortal. Folhetim não fugiu de outros “clichês” do seu autor como diálogos rápidos, corpos quase nus, humor de cunho sexual e conflitos familiares. (Foto: Reprodução/RecordTV)

Reprise

A novela foi reprisada pela Rede Família, emissora que pertence ao grupo Record, entre março e novembro de 2020.

Fonte: Site Teledramaturgia e livro “Novela, a Obra Aberta e Seus Problemas”, de Fábio Costa.

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