Campeões de Audiência: Selva de Pedra (1972/73)

Um dos grandes clássicos da teledramaturgia brasileira, a versão original da novela Selva de Pedra terminava há 50 anos como um fenômeno de público e crítica em todo o país. Produzida e exibida pela Rede Globo entre de 10 de abril de 1972 (RJ) e 12 de abril de 1972 (SP) a 23 de janeiro de 1973, em 243 capítulos, a novela é até hoje considerada uma das maiores obras-primas de Janete Clair, sendo a única até então na época a registrar a maior audiência da história da televisão brasileira com 100% dos televisores ligados no folhetim das oito, comprovando a força da novelas como veículo de cultura de massa. Escrita por Janete, com a colaboração de Dias Gomes, seu marido, e a direção de Daniel Filho (supervisor da obra), Reynaldo Boury e Walter Avancini, a trama marcou tanto a história das telenovelas que ainda teve direito a uma nova adaptação apenas 14 anos depois com Tony Ramos e Fernanda Torres nos papéis centrais. Por isso, vale relembrar essa produção impecável e campeã de audiência, que tinha nomes como Francisco Cuoco, Regina Duarte, Dina Sfat, Carlos Vereza, Carlos Eduardo Dolabella, Gilberto Martinho, Arlete Salles e Mário Lago nos papéis centrais.

Fernanda (Dina Sfat), Cristiano Vilhena (Francisco Cuoco) e Caio (Carlos Eduardo Dolabella) foram protagonistas do grande sucesso “Selva de Pedra”, novela clássica de Janete Clair que completa 50 anos do seu término. (Foto: Divulgação)

Sinopse

Na pequena vila de Campos, a jovem artista plástica Simone Marques (Regina Duarte), é testemunha da disputa entre Cristiano Vilhena (Francisco Cuoco), filho de um pregador religioso humilde, e o playboy Gastão Neves (Jorge Caldas), falecido no acidente. Tendo ciência da inocência de Cristiano, Simone resguarda o rapaz, o qual termina apaixonada. Temerosa pelo seu destino, Cristiano viaja para o Rio de Janeiro e começa a trabalhar no estaleiro do tio rico, Aristides Vilhena/Tide (Gilberto Martinho). Simone vai junto, com o objetivo de um futuro promissor para sua carreira artística. Os dois se casam e vão viver na pensão Palácio, onde conhecem Miro (Carlos Vereza), um vadio carismático, porém, de um caráter dúbio.

Convivendo diariamente com a rotina do tio, Cristiano começa a ficar fascinado pela charmosa Fernanda (Dina Sfat), uma das acionistas do estaleiro, o qual seu primo Caio (Carlos Eduardo Dolabella), é aficionado. Em dúvida entre a vida cotidiana em companhia de Simone e o poder e a riqueza com Fernanda, Cristiano cai facilmente nas armações de Miro, que lhe aconselha o término de sua união com Simone, nem que o preço a ser pago para isso seja a vida da moça. Assim, Fernanda, completamente cativada por Cristiano, descarta Caio para se casar com ele. Enquanto isso, Miro elabora um plano para assassinar Simone, condicionando assim o casamento de Cristiano, fato que o deixaria como um dos acionistas centrais do estaleiro.

Ao ser encurralada por Miro, Simone é vítima de um terrível acidente e tida como morta. Cristiano, no entanto, sentindo-se culpado pela morte de sua mulher, abandona Fernanda no altar, e o matrimônio com a ricaça não acontece. Desesperada, Fernanda enlouquece e promete se vingar de Cristiano, fazendo de tudo para frustrar os seus empreendimentos no estaleiro. Já Simone, restabelecida do acidente que sofrera, realiza uma viagem e volta utilizando um disfarce da irmã que morreu tempos atrás, sob o pseudônimo de Rosana Reis, uma conhecida artista famosa. Acontece que, durante um evento, Cristiano reconhece em Rosana sua esposa, porém, ela refuta sua afirmação e o rejeita, por atribuir ao amado a culpa pelo seu acidente.

Ainda, a polícia está no rastro de Cristiano Vilhena, acusado pela morte de Gastão Neves. Muito ressentida, Simone é a única que pode provar sua inocência. Porém, ela insiste em renegar o amor que sente por ele por conta de tudo que ele a fez passar.

Produção

Cerca de 400 fitas de videoteipe foram usadas para gravar e editar os 243 capítulos de Selva de Pedra. Tempos depois, as fitas foram reutilizadas. Nos arquivos da Globo, se encontra somente o compacto de 76 capítulos, apresentados em 1975 no lugar de Roque Santeiro, impedida de ir ao ar pela Censura Federal.

A equipe do cenógrafo Mário Monteiro projetou aproximadamente 50 ambientes distintos para a trama, entre cenários fixos e móveis.

Fernanda (Dina Sfat) e Tide (Gilberto Martinho) em cena de “Selva de Pedra” em sua versão original de 1972. Trama sobre ascensão social e vingança é uma das obras mais marcantes da televisão brasileira. (Foto: Reprodução/TV Globo)

Bastidores e curiosidades

O ponto inicial de Selva de Pedra foi uma notícia de jornal. Em uma praça do interior de Pernambuco, um jovem tocador de bumbo assassinou um indivíduo que o tinha achincalhado. Utilizando essa ideia, Janete Clair escreveu o enredo da novela. A “Maga das Oito” ainda teve como influência o romance Uma Tragédia Americana, do escritor americano Theodore Dreiser, que já tinha sido apresentado nas telonas em 1931, por Josef Von Sternberg, com Philips Holmes, Sylvya Sydney e Francis Dee nos papéis principais. Em 1951, George Stevens também adaptou o livro e dirigiu A Place in the Sun, com Montgomery Cliff, Elizabeth Taylor e Sheryl Winters. Fenômeno de público e repercussão, Selva de Pedra firmou Janete Clair como uma grande autora popular.

O par romântico central de Selva de Pedra foi um grande sucesso. Em novembro de 1972, Francisco Cuoco e Regina Duarte foram agraciados como os “Reis da Televisão” pelos leitores da Amiga, revista especializada na cobertura de TV. O Programa Silvio Santos, na época transmitido pela Globo, foi parceiro na publicação e também responsável por promover a eleição.

Selva de Pedra marcou o começo na Globo do diretor Walter Avancini, vindo da TV Tupi. Ele assumiu a novela perto do capítulo 30, quando Daniel Filho teve de se ausentar do folhetim pois estava bastante ocupado com outras funções na emissora. Neste ínterim, Milton Gonçalves e Reynaldo Boury também já tinham dirigido a obra.

No argumento original, a dona da galeria de arte onde Simone exibia seus trabalhos seria uma japonesa com o nome de Madame Katzuki. Porém, a atriz escalada para o personagem precisou deixar o elenco às pressas. O papel acabou sendo interpretado por Ida Gomes. A atriz relatou que o diretor Daniel Filho perguntou se ela sabia realizar algum sotaque. Ela argumentou que fazia o sotaque francês com exatidão. Assim, Madame Katzuki passou a ser uma francesa casada com um japonês, e tudo foi solucionado.

Com o personagem Cristiano Vilhena, Francisco Cuoco realizava seu primeiro protagonista em uma novela do horário nobre global. Ele disse que elaborou o personagem inspirado em homens que conheceu durante sua infância no Brás, bairro operário de São Paulo. Eram rapazes que jogavam bola nos campos de várzea e paqueravam as moças nos bares, instáveis quanto ao caminho que dariam à sua vida.

Abertura

Sobre a trilha da Orquestra e Coral Som Livre, a abertura clássica de Selva de Pedra, em preto e branco assim como toda a novela, apresentava o rosto do protagonista Cristiano Vilhena (Francisco Cuoco), se transformando em uma estátua de pedra, simbolizando, assim, o nome da trama. Durante a vinheta, imagens de paisagens da cidade do Rio de Janeiro, sua população e a rotina da metrópole aparecem na tela enquanto a imagem de um rosto de pedra permanece no vídeo até o seu final, com a face de Cristiano retornando ao término da abertura.

No capítulo 152, onde a identidade de Rosana Reis (Regina Duarte – Foto) é desvendada, Selva de Pedra registrou 100% de audiência, uma marca inédita na história da televisão brasileira. (Foto: Reprodução/TV Globo)

Trilha Sonora

Com canções e repertório de Marcos Valle e Paulo Sergio Valle, a trilha sonora nacional de Selva de Pedra possuía alguns destaques como o tema de abertura “Selva de Pedra”, ao som da Orquestra e Coral Som Livre. Além dela, “Capitão de Indústria” de Djalma Dias (tema de Aristides), “Mandato”, uma parceria de Osmar Milito e Quarteto Forma (tema de Simone e Cristiano), “Simone” de Ângela Valle e Eustáquio Sena (tema de Simone) e “Corpo Sano em Mente Sã” de Ormar Milito e Quarteto Forma (tema de Fernanda), entre outras, marcaram o folhetim das oito.

Já a trilha sonora internacional da obra possuía inúmeras músicas de sucesso, tais como: “Floy Joy” da girl group americana The Supremes, “Ain’t no Sunshine” do astro pop Michael Jackson (tema de Fernanda), a instrumental “A Taste of Excitement” de Carnaby Street Pop Orchestra and Choir (tema de Cristiano), “Mary and Blind Mary” de Laurent & Mardi Gras (tema de Miro) e a balada inesquecível “Rock and Roll Lullaby” do cantor americano B.J. Thomas, marcante por ser tema romântico do casal protagonista Simone e Cristiano.

Vale ressaltar que na primeira tiragem do disco, a terceira faixa do lado B aparece erroneamente com o título “If You Want More” e o crédito da composição a Waltel Branco e Antônio Faya. Na edição seguinte, o erro foi corrigido e a canção surgiu com seu título correto – “Sleepy Shores” – e com o crédito ao devido autor, Johnny Pearson. (“Teletema, a História da Música Popular Através da Teledramaturgia Brasileira”, Guilherme Bryan e Vincent Villari).

Prêmios

A novela venceu o Troféu Imprensa no ano de 1972 nas categorias de melhor novela, melhor atriz para Regina Duarte por interpretar Simone Marques/Rosana Reis e melhor ator para Francisco Cuoco por interpretar Cristiano Vilhena no folhetim das oito. Ainda, Dina Sfat foi a ganhadora do prêmio APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte), de São Paulo, na categoria de melhor atriz por interpretar Fernanda na trama de Janete Clair.

Reprise

Um compacto de Selva de Pedra foi exibida entre agosto e novembro de 1975, para substituir de maneira rápida a primeira versão de Roque Santeiro, impedida de ir ao ar pela Censura.

Remake

Entre fevereiro e agosto de 1986, foi apresentada na Globo um remake de Selva de Pedra, escrito por Regina Braga e Eloy Araújo. Os protagonistas desta nova adaptação do clássico de 1972 foram Tony Ramos (Cristiano), Fernanda Torres (Simone/Rosana), Christiane Torloni (Fernanda), e Miguel Falabella (Miro). O remake da novela está disponível desde outubro de 2022 através do Globoplay, streaming da Rede Globo.

Simone/Rosana Reis (Regina Duarte) e Cristiano Vilhena (Francisco Cuoco) em cena de “Selva de Pedra”. Protagonistas da trama de sucesso venceram prêmios posteriormente por suas atuações no folhetim. (Foto: Reprodução/TV Globo)

Audiência

A novela conseguiu o êxito de ter sido a maior audiência da história da televisão brasileira até então, comprovando a força das narrativas folhetinescas como veículo de cultura de massa. No Rio de Janeiro, de acordo com dados do Ibope na época, a novela registrou a impressionante marca de 100% de share – número de televisores ligados no horário – no capítulo 152, onde a identidade de Rosana Reis é desvendada. Não teve um único entrevistado do Ibope que informasse estar assistindo a outro canal. “De cada 100 lares consultados no Rio de Janeiro, das 20h30 às 20h45, 23 aparelhos de televisão estavam desligados e os demais 77 estavam ligados na novela. Enquanto TV Rio e Tupi davam “traço” (0%), a TV Globo reinava sozinha (100%).” (“Almanaque da TV”, Bia Braune e Rixa). A revista Cartaz, edição de 26/10/1972, em uma reportagem de Mariza Cardoso, citou que, assim como no Rio, na cidade de São Paulo também foi registrado 100% de audiência neste capítulo. (Site Teledramaturgia)

Fontes: Sites Memória Globo e Teledramaturgia.

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